quarta-feira, 6 de julho de 2011

TURBILHÃO


Imaginem vocês uma peça de teatro que divide a responsabilidade da narrativa com a Sétima Arte, o Cinema. Atores convivendo com as imagens gigantescas da tela; discurso paralelo do diretor com toda a liberdade das imagens: nuvens, ondas revoltas, entre outras; atores conversam com a tela, personagens que não estão no palco, apenas na possante linguagem da tela. Trata-se sem dúvida de uma linguagem nova. Sem modelos anteriores, mais que uma linguagem: uma contenda, um confronto entre as forças do cinema e aquela do teatro.
Imaginem vocês que isso venha envolto numa COMÉDIA tão engraçada quanto comovente, sobre uma psicanalista e dois de seus pacientes. Sobre uma mulher que não consegue se decidir entre dois homens. Sobre o destino, o acaso e sua influência na vida de cada um de nós. E sobre fantasmas. Que procuram os vivos para saber das novidades, já que lá em cima isso é proibido. E imaginem também tudo isso escrito com um rigoroso humor, estilo preciso, qualquer coisa intermédia entre Moliére e Woody Allen.
Imaginem vocês um elenco brilhante de quatro comediantes (Duaia Assumpção, Fernando Gomes, José Roberto Oliveira e Moisés Bittencourt) emoldurados por um triângulo amoroso de charme pesado (Luana Piovani, Jonas Bloch e Pedro Furtado).
Tudo isso misturado pode ficar muito ruim... mas pode ser o espetáculo do ano!
O espectador vai ao teatro com um espírito completamente diferente do que vai ao cinema. O teatro é mais cerimonioso, cultural. O cinema é cotidiano, divertimento. Para os dois juntos com a mesma importância, com que espírito o espectador virá?
Pelo menos esta interessante pergunta sociológica “TURBILHÃO” responderá.

 
Domingos Oliveira
em sua 57ª peça.

“Sou um autor seríssimo que faz um enorme esforço para não parecer que é.”

“O happy end, o final feliz, faz parte de toda a história da comédia. É uma cortesia que o autor faz com a platéia, eu explico. Certo de que na vida real aquela história terminaria mal e, por querer que o espectador, embora compreenda isso, saia do teatro contente, o autor da comédia cria bons acasos e destrói os maus, criando assim um happy end.
Ou talvez o autor tenha uma segunda intenção oculta: falar da velha e famosa harmonia do mundo. Todas as coisas em seus lugares. Sendo assim, porque de outro jeito não poderia ser.”

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Auto-Ajuda

Carta a um Jovem Ator (na íntegra)

Foi grande a minha emoção no nosso primeiro encontro.

Eu vi a avidez com que vocês queriam saber da vida para então inserir o teatro dentro dela. E nesse dia de aniversário, eu gostaria de transmitir a vocês um resumo de aniversariante, a respeito do que andei aprendendo nesses últimos 72 anos. Para depois receber perguntas a respeito. Da minha vida ou obra ou o que quiserem. Não se trata de um homem mais velho falando para os jovens. Penso que todos temos a mesma idade, que é irrelevante, não há diferença de 50 ou 60 anos quando a aventura humana tem por tempo o tempo todo, a eternidade.

Melhor que comecemos do início.

Nascemos sem termos sido consultados. Entramos na vida berrando porque provavelmente dói a primeira vez que o ar entra nos pulmões. Dizem que o segundo terço da vida é o melhor e isso está certo. Parabéns, vocês ainda têm pela frente o melhor pedaço da vida. Realmente a infância e adolescência, por mais maravilhosas que sejam, estão sempre plenas de dúvidas, inseguranças, tentativas de descobrir o próprio lugar no mundo. E a terceira parte, a velhice, vem sempre acompanhada pela decadência física, até o Rolls-Royces envelhecem.

A infância é um momento máximo de descobertas. A vida nos oferece o mundo para conhecer e a fonte do prazer é a fonte do conhecimento. São novidades a cada segundo, agradáveis e desagradáveis. Olhe uma criança com atenção, é fantástico! Sua atenção e sua sabedoria. Aí vem o grande impacto do sexo, chamado adolescência. Quando eu era adolescente achava que todo mundo era igual. Um dos meus primeiros sofrimentos sérios foi constatar que as pessoas são muito diferentes. Você pode amar alguém que detesta as coisas que você ama e vice-versa. Isso me foi muito doloroso. Outra dor eu tive quando descobri que não poderia estar em dois lugares ao mesmo tempo. E a terceira, quando constatei que eu e todos os meus e todos os que não eram meus teríamos o mesmo destino, morrer. Quando compreendi isso, chorei anos. Não por minha causa mas por pena da humanidade. Numa das minhas primeiras peças, alguém está chorando pelo mundo e quando pedem que ele pare, ele se recusa e exige o contrário, que todos chorem juntos. Que essa é a única atitude digna. Enfim, eu me embatia contra aquilo que se costuma chamar de “condição humana”. Não podemos viver no fundo do mar embora possamos perfeitamente imaginar isso. Nem voar como os pássaros, nem deixar de sofrer, às vezes brutalmente, nem evitar que nossos entes queridos sofram. O sofrimento e a morte fazem parte do pacote que involuntariamente compramos. Os homens nascem e são infelizes. E morrem querendo viver mais. Posto que a natureza colocou neles um imenso desejo de imortalidade.

Claro que tudo isso é misterioso e confuso. E atordoa as mentes jovens. Mas é inexorável. Essas e muitas outras limitações fazem parte de um contrato assinado para poder viver: a condição humana. Duas atitudes podem ser tomadas quanto a isso. Uma é a negação e a outra é a aceitação. A negação leva a um desespero irremediável, a aceitação é uma façanha quase inatingível. Por que esse paradoxo? Não sabemos. Mas lhe damos um nome. É o mistério da vida. Que nos circunda concreto como uma pedra e cuja missão do artista é se aproximar, devassar, por vezes até, descobrir algo. Essa deveria ser a função de todo homem. É a vocação humana, o mundo não será feliz enquanto todos os homens não forem artistas. A vocação do homem é criar.

Dizem que o mundo é mau, cheio de injustiças e violências e assim é, sem dúvida. Mas de quem é a culpa? A mim me parece que não é dos homens. Os homens nasceram para amar, observem de novo os bebês. Eles choram quando algo lhes falta. Quando sofrem por algo. Uma famosa experiência feita com ratos... {inserir!}

Assim somos nós, na chapa eletrificada da condição humana. Nosso sofrimento, a dor, é que faz os homens maus. O natural é o amor. E o desamor é a loucura. O homem não é o lobo do homem. A condição humana, a morte, em particular, embora seja um dado estimulante para a criação é algo de insuportável para a consciência.

Mas voltemos a este pequeno e humilde ser humano que somos cada um de nós.
Primeiro, como os ratinhos, botamos a culpa nos pais. Minha filha e eu temos muita paixão um pelo outro, quando ela era adolescente, me escreveu uma carta que começava assim: Papai, eu te odeio! Pule o mais rápido possível essa fase. Seus pais não fazem por mal, eles são tão fodidos quanto vocês e os pais deles. Estão todos sobre a bota esmagadora e na camisa de força da condição humana.

Aí arranjamos as namoradas e toda a culpa é posta no amor. Chora-se, agride-se, espanca-se o ser amado tanto quanto possível. No fundo acusando-o de não nos proteger contra as dores do mundo. Um homem se apaixona e tem a certeza de que a amada pode resolver todos os seus problemas. Estar ao seu lado é a felicidade. Quando essa ilusão se desfaz, pouco tempo depois, os ânimos tornam-se agressivos. Tudo isso é de um ridículo atroz e visto assim, à distância, somos assim mesmo os humanos. De um ridículo atroz. Queremos a perfeição, o paraíso. Um deus redentor. Embora não tenhamos nenhum indício concreto de sua existência.

Continuando a vida. Com uma das namoradas que temos, acabamos por nos casar. O sexo então é algo sublime e traz, quando resolve trazer, os filhos. Não é verdade que se tem uma vida só. O homem renasce e revive, de tão perto que ele olha seus filhos. Depois os filhos vão embora, sempre vão, e você vê com tristeza e medo a velhice que se aproxima. O corpo já não é mais confortável. Espirituais são os jovens que não pensam no corpo. A não ser para terem prazer. Os velhos são ligados ao corpo, sentem dores e incômodos, não têm muito tempo para serem espirituais.
Se vocês quiserem transcender, transcendam agora. E finalmente chega a morte. Às vezes rápida, na maior parte das vezes, dolorosa. Embora muita gente boa acredite que o último momento é sempre de satisfação.

Mas vocês acham que eu vim aqui no meu aniversário para contar uma história tão triste como essa? Estão muito enganados. O homem com seu neo-córtex poderoso, capaz de criar as mais sofisticadas tecnologias, de planejar remédios e armas, é também um lutador, um guerreiro contra a morte, melhor dizendo. O problema é saber de que lado ele luta. Do lado da vida ou do lado da morte. Você aí é Flamengo ou Fluminense? E você deixa de ser Flamengo quando o time perde, torcedor infiel? É preciso decidir radicalmente, no exagero e até à loucura, de que lado você está. Eu pessoalmente estou convencido que é melhor ficar do lado da vida. Explico o porquê.
Amar a vida, incondicionalmente. Como uma mulher por quem a gente se apaixona, um amor incondicional, como dos bons pais pelos filhos. Amar a vida, quer ela te trate bem, quer ela te trate mal. Incondicionalmente. Morrer lutando. Entre um passo e outro. Indo atrasado para uma festa animadíssima.

E como chegar aí? Parece uma atitude de super-herói, homem de ferro. Ou no mínimo, Davi diante de Golias. É fácil. É só se convencer que você é um super herói. A vocação do homem é heróica. A vocação do homem é a honestidade, a coragem, a solidariedade, a bondade. E até mesmo a misericórdia. Simplesmente porque esta é a situação mais confortável, a que menos dói. E se formos espertos, vamos aprendendo uma a uma, as técnicas e artimanhas para chegar lá.

Elas basicamente consistem em tratar bem a si mesmo. Ter consigo mesmo um desvelo, um carinho, um cuidado de mãe. A psicanalista Melaine Klein é que diz que devemos ter dentro de nós um pai e uma mãe, uma mãe que diz “Te amo, meu filho, independente de qualquer coisa que você faça”. E um pai que diz “Te amo, meu filho, mas só se você se comportar bem”. Ame aos outros como a si mesmo, diz o Cristo. E ame a si mesmo tanto quanto for possível.

E viva na ilusão! Somente o louco vive na realidade. A realidade é insuportável. O homem foi feito para sonhar e criar ilusões. Por isso os artistas são, em geral, mais felizes que os outros. Criam mais. Por isso tem tanta gente aqui querendo fazer teatro. Em que grau de ilusão você prefere viver? Essa é a sua única escolha. E a partir daí, tome toda a responsabilidade dos seus atos. Você só faz o que quer. Senão faria outra coisa. Papai e mamãe foram dormir, estão talvez, engendrando outro neném. Você está sozinho e isso não é mau. Nem Deus teve pai e mãe.
Conselhos práticos para ser feliz. Sempre lembrando que o bom conselho é aquele que a gente não tem que seguir.

1. Viver cada dia como se fosse o último. Já fizeram um ótimo filme sobre esse assunto. Um filme de jovens, “A Sociedade dos Poetas Mortos”. Carpe Diem. Sim, porque cada dia pode ser o último. Por exemplo, cada filme que faço pode ser o último. As produtoras podem não querer mais botar dinheiro, eu posso não ter mais vontade de fazer filmes e posso, naturalmente, morrer antes das filmagens. Viver cada dia como se fosse o último é, na verdade, viver bem o quanto se pode. Tirar de todo momento o máximo que tiver para dar. Como eu estou fazendo com este momento aqui. Viver cada dia como se fosse o último não é ficar pensando na morte. É prezar a vida. Saber de todos os prazeres que ela pode dar e aproveitá-los. Avidamente.
2. Respeitar os seus desejos. A máquina de desejar do homem é muito frágil. Enguiça com muita facilidade. Se você me convida para tomar um sorvete e eu digo: “Ah, não quero não.” É capaz de você desistir de tomar o sorvete. E este será um sorvete a menos na sua vida. Porque desejar é viver. O desejo é a fonte de toda saúde, de toda produtividade. Ele tem que ser cuidado, respeitado. O menor desejo de um homem deve ser atendido o mais depressa possível. Se contrariamos muito alguém, por exemplo, obrigando-o a acordar todos os dias às 6 horas da manhã para ir trabalhar naquilo que não gosta, a máquina quebra. Depois de algum tempo, esse homem não deseja mais nada. E não desejando, deseja o mal. Não deixe isso acontecer com você. Todo mundo tem que fazer o que gosta. Todo mundo tem que ganhar dinheiro no final do mês para pagar as suas contas. O Herói Moderno, o sábio, o gênio moderno, é aquele que consegue unir essas duas coisas. Esse deveria ter as suas mãos beijadas nas ruas.
3. Mas seja humilde. Com o grau elevado de auto-estima, porém humilde. Humildade é sinônimo de inteligência. O homem que sabe, sabe que não sabe. Já o burro ignora a sua burrice. Cuidado com os burros.
4. Melhor se arrepender de ter feito do que de não ter feito. Exemplo simples: Garota ao seu lado. Você tem vontade de agarrá-la. O máximo que pode acontecer é ela te dar um tapa, se você agarrá-la. Se não, o mínimo que pode acontecer é você ficar batendo com sua cabeça na parede de arrependimento. Diante da dúvida, não fazer é uma atitude antiga, do século XIX. Chama-se a Cautela. Uma atitude careta, por assim dizer. Uma coisa boa para as crianças. Fazer correndo o risco do arrependimento é, sem dúvida, o melhor negócio. Naturalmente se você não estiver causando o mal a ninguém.

Obs. O filósofo somente é digno quando segue a sua filosofia. Isso significa que não existem filósofos dignos. Ninguém é de ferro. Não pensem por um momento que eu consigo fazer essas coisas que defendo. De vez em quando sim, de vez em quando não. Somos apenas humanos. Sem culpas.

5. Você deve terminar tudo aquilo que começa. Um curso, um namoro, nem de sair do filme no meio eu gosto. Terminar aquilo que começa é o segredo, que ninguém nos ouça, da produtividade e, portanto, da riqueza. Somente terminando aquilo que você começou é que você vê se era uma merda ou uma maravilha. Começar sem acabar é depressão. Até um amor. Você deve ir até o fim. Até a vida.
6. Tudo é sexo. Gente, essa eu não preciso explicar. Sexo é a força da qual emana tudo. Talvez seja o sexo que une os átomos, tornando a matéria coesa. Até hoje acho que quando um homem e uma mulher enfiam-se um dentro do outro, a Terra treme. Os jovens de hoje dão menos importância ao sexo que os da minha geração. Não vamos analisar isso. Mas vamos acabar com isso. Como disse Millôr Fernandes, “trepar é a única coisa que é bom mesmo quando é ruim.” Na bíblia não se fala em trepar. Se diz “conhecer”. Sexo é uma forma de conhecimento absolutamente notável. Somente na cama as pessoas revelam como realmente são, é curiosíssimo, deslumbrante. Muito educativo. O amor é o efeito colateral do sexo. E também a paixão, embora esta tenha uma maior transcendência. Sexo. Esqueça a pornografia. É um mito da sociedade de consumo. O mito de que é possível trepar indiferentemente. Se existe algo na vida que desperta sentimentos modificadores, isto é o sexo. Muito educativo. Se esta palestra fosse uma suruba, sairemos daqui tendo aprendido muito mais. Sobre Deus, sobre a vida, sobre os homens.
7. Liberdade. Essa é um caso sério. Não há nada que um homem deseje mais e não há nada de que ele tenha mais medo. É ótimo poder botar sobre os outros ou sobre a sociedade seus fracassos e dores. É ótimo dizer “eu fiz aquilo obrigado” ou “eu não fiz aquilo porque não deixaram”. É ótimo, porém falso. Um homem é responsável por todos os seus atos. Bons ou maus. Se eu não quisesse estar aqui, estaria em outro lugar. Ainda mais no dia do meu aniversário. Quando você assume a responsabilidade de todos os seus atos, acredita, como Sartre, que a liberdade do homem é total e infinita. Você ganha também a possibilidade de resolver com você mesmo os seus problemas. Ninguém nunca te obrigou a nada. Foi você que quis, o tempo inteiro. A responsabilidade é sua. Quer você queira, quer não. Não importa o que o passado fez de mim. Importa o que eu farei com que o passado fez de mim. Uma das frases que eu mais gosto é de Píndaro, o Grego. “Oh, minha alma! Não aspira a vida imortal, porém esgota o campo do possível.”
8. Os jovens em geral sentem muita culpa. Culpa de tudo. Até de ter nascido. Acontece alguma coisa errada, deve ter sido ele que fez. Lute contra isso. Seja inocente. Você é inocente. Ninguém pode te culpar de nada. Nem de ser vagabundo, nem de ser galinha, egoísta ou mal comportado. Você é inocente. Inocente por ausência de uma intenção culposa. Se você é um homem reto e bom, se não quer destruir nada e a ninguém, você é inocente. Mesmo que a despeito à sua vontade algo seja destruído ou morto. Nunca admita que a culpa é sua, se você não teve a intenção culposa. Retirar a culpa dos outros é uma atitude de tirano, covarde. É um desaforo. Não admita.
9. Mas é bobagem, tudo isso. Vocês têm muitas coisas a aprender, para viver melhor, e cada um aprenderá ao seu modo. A morte não é mais que um estímulo criativo. Quando ela chegar, você nem saberá, porque estará morto. O importante é amar a vida. Ter a noção profunda de sua extrema felicidade ou a extrema noção da sua profunda felicidade. A vida não tem limites nem regras. É uma contínua luta. E você está vivo. Talvez até um dia mais próximo do que você pensa, você faça 72 anos. O mundo é uma beleza. Se eu não tivesse o mundo dentro de mim, eu ficaria cego quando abrisse os olhos. E o teatro é uma beleza. É beber o vinho de uma existência inteira na taça frágil de uma hora. Um beijo na boca de cada um de vocês. E obrigado pela atenção.


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Tenho algumas coisas nas quais acredito. Algumas normas, princípios ou mandamentos. Que me governam. São 12. Moisés só tinha 10.
A partir da próxima postagem, lanço sobre a mesa 1 a 1.


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LEGADO SEXTO

Temas Policiais para pensar antes de dormir... São raríssimas as peças policiais.

...personagem interessante: a velha que vai deixar uma herança mas não morre nunca...

...o encontro do assassino... com o suicida. Assim a vítima é mais perigosa que o agressor.

...o detetive cego: as vantagens de ter um sentido a menos...

...o crime dentro da burocracia da grande empresa. Há um lá disposto a tudo para galgar os degraus. Mas será que existe outro?...

...um moribundo como detetive. ele tem direito a tudo e resolver o crime é seu último prazer...

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

LEGADO QUINTO

um romance, cujo personagem principal é uma puta que enloquece e que se chama ...Vida. Contado por alguém que a amou além de qualquer limite. (a Vida)
acompanhou-a durante muito tempo (a Vida)
quase enloqueceu por causa dela (da Vida), tentando salvá-la (a Vida)
E que termina por perdê-la (a Vida).
Esta metáfora (ou jogo de palavras) me parece tão estupidamente concreta que me fascina.


AUTO-AJUDA
Faço 72 anos no domingo. O Teatro Tablado resolveu fazer uma festa em minha homenagem dia 27, sábado. Então, em 27, 72. Prometi uma daquelas besteiras, uma carta que será lida para os jovens estudantes por este ancião que vos fala. Uma espécie de carta para um jovem ator. Como se eu fosse um Rilke ao poeta. Não escreverei agora porque não posso estragar a surpresa, mas começa assim:

Foi grande a minha emoção no nosso primeiro encontro.

Eu vi a avidez com que vocês queriam saber da vida para então inserir o teatro dentro dela. E nesse dia de aniversário, eu gostaria de transmitir a vocês um resumo de aniversariante, a respeito do que andei aprendendo nesses últimos 72 anos. Para depois receber perguntas a respeito. Da minha vida ou obra ou o que quiserem. Não se trata de um homem mais velho falando para os jovens. Penso que todos temos a mesma idade, que é irrelevante, não há diferença de 50 ou 60 anos quando a aventura humana tem por tempo o tempo todo, a eternidade.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

LEGADO QUARTO

l
Sempre tive vontade de escrever um filme que começa com passos de uma mulher na rua, decididos e apressados, que fundem para outros passos, da mesma mulher na mesma rua, 10 anos depois. O ruído dos saltos... daí em diante, se desenvolvem duas estórias paralelas. Do dia em que ela, personagem, deixou a casa dos pais pela primeira vez para ir morar sozinha e do dia em que ela abandonou o primeiro marido e grande amor. É só isso.


E basta.






AUTO-AJUDA:

(aqui vai o texto que termina minha peça e meu filme "Separações". Ele me veio inteiro, quase que ditado, num acordar, durante o final dos ensaios da peça. O escritor às vezes tem esses rompantes, chamando de inspiração. Então quis colocar o texto no final da peça. E depois, no filme. Mas achei que os atoes não iam gostar. Iam afinal, ficar inseguros com tantas palavras no final. Não é costume terminar peças ou filmes com discursos filosóficos. Então resolvi mentir. E dizer que aquele era um texto Caldaico que eu tinha descoberto em certo National Geographic. Um texto achado numa escavação arqueológica requintadíssima. Que eu tinha apenas traduzido. Achei que assim os atores poderiam me levar a sério. Menti. Deu certo. E mantive essa mentira até o final da montagem do filme. Isto é, por mais de dois anos. Acho que só a Priscilla sabia. O santo de casa não faz milagre, sábios de casa, então... não têm chance. O respeitado filósofo já morreu no mínimo há 50 anos.)



O HOMEM LÚCIDO


O homem lúcido sabe que a vida é uma carga tamanha de acontecimentos e emoções que nunca se entusiasma com ela, assim como não teme a Morte. O homem lúcido sabe que viver e morrer são o mesmo em matéria de Valor, posto que a Vida contém tantos sofrimentos que a sua cessação não pode ser considerada um mal.

O homem lúcido sabe que é o equilibrista na corda bamba da existência. Sabe que, por opção ou acidente, é possível cair no abismo, a qualquer momento, interrompendo a sessão do circo.

Pode também o homem lúcido optar pela Vida. Aí então ele esgotará todas as suas possibilidades, passeará por seu campo aberto e por suas vielas floridas.

Saberá ver a beleza em tudo. Terá amantes, amigos, ideais. Urdirá planos e os realizará.

Resistirá aos infortúnios e até às doenças. E, se atingido por algum desses emissários, saberá suportá-los com coragem e mansidão.

Morrerá o homem lúcido de causas naturais e em idade avançada, cercado por filhos e netos que seguirão sua magnífica aventura.
Pairará então sobre sua memória uma aura de bondade. Dir-sé-á: aquele amou muito e fez bem às pessoas.

A justa lei máxima da natureza obriga que a quantidade da acontecimentos maus na vida de um homem iguale-se sempre à quantidade de acontecimentos favoráveis. O Homem lúcido que optou pela Vida, com o consentimento dos Deuses, tem o poder magno alterar esta lei. Na sua vida, os acontecimentos favoráveis estarão sempre em maioria. Esta é uma cortesia que a Natureza faz com os homens lúcidos.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

LEGADO

Repetiei aqui, comentadamente, a parte desta sessão que foi iniciada no outro blog. Para que o legado fique inteiro.



LEGADO PRIMEIRO!
...Gostaria de ter escrito uma estória baseada na vida real. (qual estória não é baseada na vida real?) de uma mulher chamada Maria, de repente descobre que tem AIDS e só pode ter pego de um caso antigo, com quem teve um encontro recente, chamemos de João. O único com quem transou sem camisinha, só pode ter sido dele. E foi só uma noite, depois nunca mais viu.
Então ela vai procurá-lo, desesperada e possessa, para dizer que ele não tinha o direito de fazer isso com ela. Que ele é um assassino.
João leva um enorme susto. Não sabia que tem AIDS. Faz o exame, que dá positivo. Aí ele tem certeza que pegou dela. Ele vai reclamar, chamá-la de assassina.
Nessa pequena trama moderna, jamais saberemos quem pegou de quem a doença. Porém, na aventura de descobrir, os dois, igualados pela infelicidade, acabam por afeiçoar-se, apaixonam-se, casam e estão felizes até hoje. Sem camisinha. Que aliás, é um bom título. * Isso me soa como uma trama paralela de um filme com várias tramas.


LEGADO SEGUNDO
Gostaria de escrever uma estória de amor sofrido. Que coloca em cena um embate de idades.
Uma mulher chamada Lucília (a pedido do blogueiro Bayão) tem dois amantes. E ama os dois. Verdadeiramente, sem saber escolher porque eles lhe oferecem coisas muito diferentes.
Um é muito mais velho e outro muito mais moço que ela.
Penso que eles se odeiam. Embora mal se conheçam. E desejam a morte, um do outro. É um thriller, com suspense. O velho planeja detalhadamente matar o moço, que por sua vez, planeja matar o velho. Pois nenhum dos dois conseguiria viver sem Lucília.
No desenrolar da trama, é ela quem morre primeiro, não sei bem como. Talvez nem saibamos quem matou, posto que ela estava num fogo cruzado. Imagino cenas fortes.
1. O encontro dos dois rivais tentando convencer um ao outro a largar a mulher, para não se tornarem assassinos.
2. A descoberta de Lucília que algo terrível está para acontecer. Embora na aparência, seja uma risonha história de paixão.
O jovem morre também, assassinado pelo velho. Desesperado porque Lucília morreu.
E fica vivo, ele é o sobrevivente. Fica quem não devia ficar: O velho sobrevive. Talvez seja uma tragédia, mas melhor que seja uma comédia. Inglesa. Elegante.


LEGADO TERCEIRO
Histórias podem partir de uma situação, até de um sentimento, ou diretamente de um personagem.
Nosso personagem é um confidente profissional. Com a vocação de um confidente. Tudo começou quando ele parou de guiar automóveis, ficou com medo dos outros automóveis e tornou-se um carona contumaz. Então ele ouve confidências de quem guia. Vantagens da fobia. Dois casais lhe dão carona freqüentemente. Digamos o casal A e B e o casal X e Y. Carona para o trabalho, de volta para o trabalho. Um para a pesca do fim de semana, de volta da pesca. Então ele recebe, uma a uma, as confidencias de A, em crise de casamento com B, e amante de Y. Depois de X, em crise no casamento com Y, e amante de B. E assim por diante, ele toma conhecimento de tudo. Sendo que os amantes não sabem que são traídos.
Uma cena interessante seria um jantar dos cinco, no qual todos aparentam casais felizes. E ele sabe de tudo e tem suas idéias próprias, de quem deveria ficar com quem. Então ele manobra e consegue trocar os casais. Mas nada dá certo, etc., cupido não se deixa manobrar, todos acabam descobrindo que ele sabia e querendo trucidar. Sentindo-se traídos porque não foram comunicados.
Não sei como termina isso. A única coisa que sei é que a última imagem é ele sozinho, guiando um carro velho que comprou.
É possível que ele seja viúvo de uma mulher fiel, que ele nunca traiu. E que agora, depois de anos, esteja se engraçando desajeitadamente de uma senhora bem sapeca, da vizinhança.
É uma comédia Molieresca.
Há pessoas assim.



AUTO-AJUDA:
Nunca entendi porque a transmissão de experiência de uma pessoa para outra chama-se "auto-ajuda". É o outro que ajuda, com sua vivência evita uma repetição de erros. Não acho que esse tipo de livro seja tão imbecil assim. Em geral, repetem sabedorias ancestrais de modo mais ou menos moderno. Ou lembram as regras primeiras do bom senso.
Em geral, dentro de um livro desses há sempre um pensamento útil, afinal, sabedoria é como mãe, cada um tem a sua.
Sou da geração de Dale Carnegie, que pintou e bordou, na época dele. Vendeu tanto quanto Paulo Coelho ou Fritzkahn com um livro chamado "Como vencer na vida e influenciar pessoas". Eu, com 15 anos, gostava muito. Enfim, da semana que vem em diante, coloco aqui os cacos de sabedoria da minha lavra. Ou minhas frases prediletas. Tentarei dar uma estrutura a tudo isso. Dizem que os bons conselhos são aqueles que você não precisa seguir.
"A vida é uma estória contada por um louco. Cheia de som, cheia de fúria, e significando porra nenhuma." Ou "um momento de beleza e uma alegria para sempre". Ou ainda "the world is a word, o mundo é uma palavra." que dizem que é de Shakespeare, mas eu nunca achei em peça nenhuma.